
Jorge Miranda – Administrador da Lusa, Fernando Correia de Oliveira, João Pinheiro de Almeida e Alexandre Ribeiro de Almeida (Lisboa)
O curso de formação de estagiários e correspondentes da Agência Lusa, que ficou conhecido como Pedrouços 88, a melhor, mais completa e mais eficaz ação de formação jamais levada a cabo pela Lusa, foi a primeira em que participei como formador, explicando a teoria do Jornalismo de Agência e, sobretudo, a prática da escrita de notícias.
O curso, que na minha opinião “salvou” a Lusa, ao criar uma geração de “jornalistas Lusa”, por oposição aos jornalistas da ANOP e da NP que, na fusão das Agências, constituíram a redação da Lusa, ficou na matriz da Agência.
Não só pelos vários participantes que acabaram por integrar a Redacção, em Lisboa, no Porto ou como correspondentes espalhados pelo país (incluindo as Regiões Autónomas), mas também pela dúvida que, ainda hoje, é levantada, várias gerações depois, como sinónimo de que algo pode não estar bem na notícia: “Será que a avó do Emídio vai perceber isto?”.
Ao explicar aos estagiários de Pedrouços que a notícia, para ser eficaz, tem de ser entendida por quem a lê, pelo que há que fornecer todos os dados e não partir do princípio de que os leitores sabem do que estamos a falar, um dos jovens, o Emídio Simões, comentando uma notícia escrita pelos seus camaradas, exclamou: “A minha avó não sabe o que é isso!”.
Desde então, em todas as ações em que participei (mesmo em Cabo Verde) apresentava o exemplo da avó do Emídio, que deve ser a avó mais conhecida do mundo jornalístico.
Como também ficou, mas menos usada hoje em dia, a imagem que sintetiza a essência do que deve estar e o que não deve estar na notícia:
No curso não foi esta a imagem, mas uns gatafunhos desenhados num cavalete com folhas de papel, o que repeti em algumas ações posteriores na Lusa e fora da Agência.
Era por aqui que começava sempre as formações, para explicar a diferença entre informação, notícia e propaganda ou publicidade.
Sobre Pedrouços 88 podem encontrar testemunhos e depoimentos de vários outros envolvidos, incluindo alguns dos então estagiários.
A faceta formadora da Lusa iniciada em 1988 esteve sem continuidade até à chegada do então diretor Luís Miguel Viana, que promoveu, através do Oscar Mascarenhas, os primeiros protocolos com instituições universitárias para fornecer estágios curriculares aos alunos dos cursos de Jornalismo.
Colaborei com o Oscar na elaboração do esquema dos estágios, que incluía encontros com os editores das várias secções da Redacção, aulas de informática e, sobretudo, a parte mais prática da elaboração de notícias (a de que me encarreguei eu), que veio a revelar-se mais importante, dado o caráter mais teórico da formação académica (eu tinha de falar na Académica….) dos estudantes.
As Direções de Informação que se seguiram optaram por alargar as ações de formação e passaram a realizar, com algum caráter periódico, iniciativas para refrescar conhecimentos, corrigir erros, etc., tendo como destinatários os redatores, editores, delegados e correspondentes.
Muito antes da pandemia ter obrigado ao teletrabalho, participei, com o António Caeiro, em sessões por vídeo chamada com os Delegados e Correspondentes da Lusa no estrangeiro. O que, dadas as diferenças horárias, foi um esforço bem interessante.
Das muitas ações de formação em que participei pela Lusa, quero apenas destacar, pela importância que teve na minha vida, a realizada na Inforpress em Cabo Verde, em 2009. Os responsáveis da Agência cabo-verdiana tinham pedido auxílio à Lusa para uma formação específica em Jornalismo de Agência, tanto para redatores como para editores, e fui escolhido pela Administração para a desenvolver.
Voltei, mais tarde, já não pela Lusa mas a título pessoal, para novas acções de formação, que incluíram preparar e organizar o esquema de cobertura de eleições autárquicas e legislativas.
A última formação em Cabo Verde, em 2013, serviu também para lançamento do Livro de Estilo da Inforpress, editado pela Agência, que elaborei em colaboração com a Redacção e que foi apresentado aos estudantes de Jornalismo em duas instituições universitárias na Ilha de Santiago.
A colaboração da Lusa com a Inforpress tem-se mantido ao longo dos anos, com várias outras ações de formação.
A vocação da Lusa como escola de formação fica amplamente espelhada nas ações desenvolvidas em parceria com instituições universitárias, como as realizadas com o ISCTE (2014) e com a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (2017), entre outras.
Vocação que se alargou ao espaço lusófono, com os cursos que realizou em Cabo Verde, já referidos, e com uma acção de formação promovida pela Aliança das Agências de Língua Oficial Portuguesa, de que na altura a Lusa era presidente, que reuniu na sede da Agência em Lisboa jornalistas de Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe.
Não é por acaso que nas redações e nas instituições universitárias com cursos de Jornalismo se reconhece que a verdadeira escola de jornalismo é a agência Lusa. Quem domina a técnica da escrita de notícias em Agência consegue adaptar-se facilmente a todas as plataformas jornalísticas.
Não esquecendo, claro, que ser jornalista não tem apenas a ver com técnica, mas também, e sobretudo, com talento e transpiração (no sentido de esforço), a famosa regra dos três T’s.
Mais recentemente, a minha participação nas ações de formação da Lusa assumiu um caráter menos prático, mais como relato de histórias e experiências, juntamente com a Natal Vaz e o António Caeiro, no fundo uma espécie de memória e de história da Agência.
Mas mesmo assim, além de contarmos as nossas vivências, casos insólitos, episódios engraçados ou curiosos, não deixamos de dar aos jovens estudantes alguns conselhos práticos para enfrentarem o dia-a-dia numa redação e para dominarem as técnicas de escrita de notícias.
E isso é, penso, o que faz a diferença da Lusa enquanto Escola de Jornalismo: a possibilidade de os estagiários/formandos poderem, em cenário real, colocar em prática os conhecimentos teóricos adquiridos nos cursos que tiraram ou estão a tirar, mas sobretudo aprenderem, imersos numa redação, como fazer notícias com as características que se exigem numa Agência noticiosa: curtas, claras, concisas e corretas.
A que junto a eficácia da notícia, medida sempre pela resposta à dúvida: “A avó do Emídio vai perceber o que escrevi?”.
João Pinheiro de Almeida
Jornalista e formador no curso de Pedrouços 1988
Grupo de formandos do curso "Pedrouços 1988"