"Quatro meses que mudaram vidas"
Camas que, misteriosamente, ganhavam vida durante a noite e pousavam no vestíbulo entre as camaratas masculina e feminina, com o inquilino ferrado no sono, regressos à “caserna” com a carrinha do pão, às seis da manhã, paus de giz a voarem e aterrarem nas cabeças dos que promoviam a galhofa…
E, juntamente com tudo isso, muito trabalho e vontade de aprender o bê-á-bá do jornalismo.
Aquele fim de tarde de setembro de 1988 marcou a minha vida.
A minha e a de uns quantos miúdos na casa dos 20 anos. Recebidos pela Leonor Sá Machado e pela Teresa Corte-Real, arrumámos a trouxa nas camaratas e zarpámos para o primeiro de muitos jantares de grupo. Ao fim da noite parecia que já nos conhecíamos há anos.
Durante
quatro meses, nas aulas, de manhã e de tarde, fomos aprendendo os fundamentos
da profissão, ensinados por craques do jornalismo de agência e por monitores de
áreas tão diversas como a língua portuguesa ou o direito.
Foram horas e horas a construir pirâmides invertidas e a descobrir os segredos de um lead que respondesse às perguntas essenciais.
Para muitos, a grande maioria, tudo isso era totalmente novo. Tal como o conselho de usar uma técnica muito particular e que tinha tantas variantes quantos os utilizadores:
CEE – Concentração, Eficácia e Estilo.
Éramos um corpo estranho na Escola de Pescas de Pedrouços e tínhamos de respeitar as suas regras, por vezes muito apertadas. O precetor estava sempre atento e não perdoava.
Ao almoço, na cantina, e nos espaços comuns da escola, o contacto com os estudantes de pesca era interdito. Apenas havia autorização para os defrontarmos em futeboladas, que eram praticamente diárias e quase sempre com o mesmo resultado, que me abstenho de recordar…
Se saíamos à noite – e não eram raras as incursões a locais de culto como o Alcântara-Mar –, as portas da escola só abriam às seis da manhã, pelo que o regresso acontecia com a chegada da carrinha do pão. Mas havia heróis que às 10:00 conseguiam estar com relativa atenção na primeira aula do dia.
Foram quatro meses de intensa aprendizagem jornalística e social, que nos permitiram criar fortes laços de camaradagem e culminaram com uma viagem de finalistas a Madrid, durante a qual a visita à sede da EFE se misturou com mais uma enorme farra.
Dali
saiu um importante reforço para a Lusa.
Em 16 de janeiro de 1989 entrámos dezena
e meia de formandos para a redação e, dois anos depois, o nosso jantar de
celebração acabou abruptamente: tinha começado a Guerra do Golfo e fomos todos
para a redação para ajudar no que fosse preciso. Por iniciativa conjunta e sem
ninguém pestanejar.
Estive na Lusa até 31 de outubro de 2012. Ao longo desses quase 24 anos tive sempre um enorme orgulho em vestir a camisola, mas na altura senti que tinha chegado o momento de procurar outras coisas para fazer.
Fui assessor de imprensa de várias entidades e diretor de comunicação do Vitória Futebol Clube e do Casa Pia Atlético Clube. Agora sou técnico superior na Divisão de Comunicação e Imagem da Câmara Municipal de Setúbal.
Dez anos depois de sair, continuo, no entanto, a sentir a Lusa como a minha casa-mãe.
Emídio Simões
Formando do curso de Pedrouços 1988 e jornalista na Lusa durante 24 anos
Grupo de formandos do curso "Pedrouços 1988"