Os jornalistas de uma agência dividem-se entre várias tensões que impulsionam a
sua atividade diária:
- Estão «atrás de uma história», procuram obter informação rigorosa sobre algo
que apuraram, mas ainda há muita pesquisa a fazer, obter contactos de
responsáveis, descobrir fontes fidedignas, procurar documentos. É todo um
trabalho de detetive. Por vezes em vão, porque afinal a realidade não era
aquilo que suspeitávamos, e o interesse noticioso é quase nulo ou nulo. Nunca é trabalho perdido, porque nessa busca
de Sherlock aprende-se muito, descobrem-se novas histórias e ganham-se novas
fontes e contactos. É toda uma aprendizagem que fica.
- Fazem serviços de agenda, eventos importantes que os clientes da Lusa esperam
que sejam feitos para não terem de lá enviar os seus próprios jornalistas.
- Seguem a atualidade. O
jornalismo é uma ‘ciência’ cheia de novidades. Hoje podemos estar todos focados
num grande acontecimento, mas amanhã surge outro, ainda mais importante, em
termos noticiosos ou de interesse público, e o foco mudou de um evento para
outro.
- Seguimento de temas. Se
durante toda a semana uma região está a ser assolada por incêndios, o
jornalista tem de acompanhar diariamente o tema, procurar dados evolutivos,
consequências para os cidadãos, dificuldades das entidades oficiais, apuramento
de responsabilidades, análise em profundidade e contexto. Nas redações é comum
dizer-se «não podemos deixar cair um tema». Os assuntos não deixam de ser
relevantes só porque surgiram outros novos mais importantes. Temos de continuar
a seguir.
- Antecipação e preparação de
futuros eventos de grande dimensão, como atos eleitorais, congressos
partidários, cimeiras políticas, grandes eventos desportivos, entre outros.
- Marcação e preparação de entrevistas. O jornalista quer a entrevista
que pode ser uma grande notícia no contexto existente, mas nem sempre a
personalidade está interessada nisso. Nem sempre é fácil conseguir convencer o
entrevistado que uma entrevista naquele momento é muito importante para
esclarecer a sociedade. É um trabalho de ‘formiguinha’, muito tempo ao
telefone, e nem sempre com sucesso. É uma tarefa quase diária do jornalista,
tentar ‘sacar boas entrevistas’. Depois
de garantidas, a preparação também é um processo exigente. Ler muitas
entrevistas anteriores, procurar temas periclitantes que possam dar boas
respostas e venham a ser notícia, por serem dados novos, nunca antes
pronunciados.
- Atualização de dados para assinalar
uma efeméride muito importante. São buscas contínuas de arquivos, procura
de ângulos novos para trazer novidade a um acontecimento verificado há anos.
Quem entrevistar, que dados novos existem, que realidades nasceram desse evento
antigo? É aliciante, mas é também um processo delicado e difícil.
- Reportagens sobre situações
de interesse público. A reportagem é um género exigente porque requer não
só muito trabalho na preparação antes de o jornalista ir para o terreno, como
exige uma sensibilidade especial. Cada caso é um caso, ir para o terreno requer
um estudo minucioso sobre a forma de fazer a abordagem às pessoas com quem
vamos falar.
A preparação da reportagem é tão importante como a sua realização, porque devem
estar já resolvidas várias dificuldades, marcadas entrevistas e visitas
previamente, etc. Mas, a intuição, a atenção ao detalhe, a capacidade de
relacionar assuntos, a sensibilidade para a forma como se questionam as
pessoas, são aspetos fundamentais que podem ditar o sucesso ou o fracasso de
uma reportagem.
A panóplia de atividades diárias
desenvolvidas pelos jornalísticas é enorme e, muitas vezes, o jornalista não
tem o tempo necessário para refletir sobre os temas em que trabalha sob enorme
pressão e necessidade de rapidez.
Um chefe de redação do Folha de
S. Paulo dizia que o jornalismo diário é o trabalho mais imperfeito que existe:
«Todos os dias temos de escrever notícias, mas elas estão sempre incompletas,
porque não é possível apurar tudo o que é relevante sobre um determinado
assunto num só dia…»
Apesar de tão imperfeito, o jornalismo acaba por ser o melhor método que existe
para informar as sociedades.
Acreditar em tudo o que nos aparece no telemóvel, sem sabermos quem o escreveu,
com que motivações, não é, certamente, a solução.
O jornalismo está repleto de imperfeições, mas continua a ser a única forma de
apresentar a atualidade aos cidadãos com garantia de algum rigor, ética,
deontologia, independência, isenção e seriedade.
Essa pressão enorme que existe
sobre o jornalismo nos dias de hoje, exige de nós, jornalistas, um esforço
suplementar na autocrítica e na capacidade de nos tornarmos mais competentes
para combatermos a onda de desconfiança que existe sobre a profissão.
Esse momento de se parar, refletir, avaliar os prós e os contras, revisitar as
regras, os valores do jornalismo. Esse
momento pode, e deve ser uma ação de formação interna, só para a redação.
A Escola Lusa vai realizar já em janeiro um curso de Jornalismo de Agência II,
para toda a redação, o que constituirá um momento fundamental para se fazer
essa análise crítica e melhorar práticas do quotidiano laboral.
Os cursos internos são fundamentais para que uma redação sinta o apoio
necessário para reforçar as suas orientações em termos de método e práticas
jornalísticas. Apontar caminhos, boas práticas, refletir sobre erros,
aperfeiçoar métodos e, sobretudo, voltar ao básico: Porque é que fazemos
jornalismo?
Todos os jornalistas leram manuais de jornalismo, mas nunca é demais voltarmos
ao básico e refletirmos sobre como melhorar a nossa prática diária. Há sempre
algo a melhorar. Há sempre ideias que já não pensávamos nelas, por vício da
rapidez e da pressão diária.
A
formação interna numa redação deve ser rotina.
O mundo está a mudar, o jornalismo está pressionado, mas as regras que dão
garantias ao cidadão da seriedade com que fazemos notícias continuam a ser as
mesmas.
É essa reflexão crítica
que pretendemos fazer.